quinta-feira, 11 de setembro de 2008

Valor


Eu me lembro como se fosse hoje. E tenho certeza que jamais vou esquecer. Domingo, 6 de novembro de 2005. Acordo ansioso, checo o gravador, a pauta impressa, tomo café e sigo para um hotel na zona sul da capital paulista. O motivo? Vou entrevistar Clodoaldo Silva, o nosso Tubarão, em matéria que faria parte da distante Sentidos Nº32. A agenda lotada do nadador previa um evento para o período da tarde e, através de sua assessoria, marcamos o encontro para a manhã. Um pouco sonado, Clodoaldo me cumprimenta de forma protocolar, meio fria. Na seqüência das perguntas se solta, damos risada e o olho com uma admiração crescente. A cada frase, a certeza de que um campeão na vida e no esporte estava na minha frente. Naquela época Clodoaldo tinha sido eleito o melhor paratleta do mundo, muito pelo seu fantástico desempenho em Atenas, em 2004, quando conquistou 6 ouros e 1 prata, na categoria S4. O tempo passou, nos encontramos novamente mais algumas vezes, e durante o Parapan do Rio tive a honra de conhecer sua mãe e um de seus irmãos. A simplicidade e a alegria de ambos só fizeram aumentar meu respeito por tudo que cerca nosso campeão. Preparado para Pequim, e na vontade de destruir novamente na piscina, vem o processo de reclassificação e o resultado é divulgado na véspera do início das competições. Clodoaldo não mais pertence a S4, mas sim a S5. A diferença entre as categorias é enorme. Só para se ter uma idéia, nosso menino de ouro, Daniel Dias, compete na mesma S5. Nos 100 metros borboleta, disputado terça-feira, chega em primeiro, para mais uma medalha de ouro. Fechando a prova em 8º e último lugar, 10 segundos depois - uma eternidade na natação - está lá, nosso Tubarão. E ele disse. "Estou aqui pelos meus companheiros. Não concordo com tudo o que aconteceu comigo, mas quero participar do revezamento, pela equipe, por todos". E nessa manhã ensolarada, a hora da verdade. A disputa da prova dos 4 x 50 metros livres, categoria 20 pontos, prova multifuncional em que atletas de diferentes categorias compõem as equipes. Clodoaldo se concentra, ajeita a touca, em ritual de longa data e abre a prova, seguido por Adriano Lima, Joon Sok Seo e Daniel. No final, o 3º lugar e a medalha de bronze. Pronto. O Tubarão, dono de marcas fantásticas e eternas, está no lugar que merece. No pódio. Na cerimônia de premiação, percebo que é o mais ansioso. As mãos na cadeira de rodas, querendo impulsioná-la, meio que atropelando o protocolo e o sorriso estampado na face. Depois, nas entrevistas, a voz embargada é evidente. Emocionado, diz. "Ganhar medalhas individualmente é muito bom, mas muito mais importante é conquistar uma em equipe. Não quero fazer desabafos, mas ressaltar a união da delegação. O grupo é maravilhoso e isso é o que importa". Tenho certeza que, entre todos os troféus e medalhas douradas que Clodoaldo coleciona, essa de bronze terá um significado especial. E, talvez, seja a mais valiosa de todas.
Foto: Saulo Cruz/CPB

Um comentário:

Dirceu - Áurea Editora disse...

Uma justa homenagem à esse símbolo do paradesporto brasileiro. Quem já teve contato com Clodoaldo e conhece sua postura profissional, jamais esquecerá tudo o que ele fez em como atleta e como pessoa. Parabéns Paulo pela iniciativa.